quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

O sofrer passa

“O sofrer passa.
Não passa o ter sofrido.”


Se me não falha a memória, a frase pertence ao grande escritor francês F. Mauriac. Seja de quem for, ela só pode ter brotado da experiência de um coração ferido.
Tudo passa na vida, passam as feridas, mas permanecem as cicatrizes.
Há cicatrizes horrendas de feridas não assumidas, a clamar vingança, a escorrer amargura.
Há, pelo contrário, cicatrizes cheias de doçura, de vidas gastas no amor e no serviço.
Ainda o conheci, embora já no declínio. Experimentou a perseguição e o exílio mas, ao mesmo tempo, nunca perdeu o optimismo nem o desejo de construir. Dele se dizia, nos últimos anos em que ia progressivamente perdendo faculdades: “Que ruína!” Houve, no entanto, quem acrescentasse: “Sim, mas que bela ruína!”
Li algures que um velho amargo é a obra-prima do diabo. Bem observado; por onde passa deixa um sulco de tristeza e azedume. Podíamos, no entanto, contrapor que um velho sereno, pacificado é um bálsamo para as nossas feridas mais teimosas.
Quando Jesus, depois de crucificado e morto, se manifestou cheio de vida aos seus amigos, quis que vissem as cicatrizes dos cravos e da lança. Cicatrizes gloriosas a proclamar a vitória da vida sobre a morte. Mais do que em qualquer outro caso, o sofrer passou mas ficou o ter sofrido.

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