domingo, 1 de junho de 2008

O tempo comum

Terminou ontem, com a solenidade do Pentecostes, o tempo litúrgico da Páscoa. Cinquenta dias em que se vai pedagogicamente desenvolvendo o Mistério pascal. Depois entramos abruptamente naquele que é chamado o “Tempo ordinário ou comum”. Como o nome indica, não se foca nenhum momento particularmente importante; vamos contemplando pacificamente os ditos e os feitos de Jesus guiados pela interpretação dos quatro evangelistas. É fácil que um tempo sem relevo nos vá achatando a vida, eliminando todo o relevo e transformando-a em monotonia aborrecida. A reforma litúrgica, ordenada pelo Concílio Vaticano II, melhorou muito o ritmo da repetição. Mesmo assim elenco é pouco variado e é isso precisamente que torna as celebrações aborrecidas. Mas a vida é assim.
Quando se é mais novo pensa-se que a ela vai ser uma sucessão de acontecimentos sempre diferentes, como num espectáculo de magia em que nunca se sabe o que vem a seguir. Tratando-se de um filme, ninguém gosta que lhe digam qual é o desfecho; isso tiraria todo o interesse, o suspense. Pensam na profissão futura como se ela fosse uma série de surpresas. Imaginam o trabalho de um “Prémio Nobel” como uma sucessão diária de proezas. Algum deles lembrou que uma descoberta científica era fruto de muito suor e alguma sorte (além da ciência, claro!).
É possível que uma secção importante da sociedade tenha estacionado nesta fase adolescente que conduz a uma quase incapacidade de assumir compromissos duráveis, muito especialmente compromissos para toda a vida. Casamento e votos religiosos ficam como em suspenso, a ver se dá.
A maturidade revela-se quando tais compromissos se encaram como são: para o melhor e para o pior. Claro que um cristão deve contar com uma ajuda que nunca é negada a quem reconhece a sua própria fraqueza.
Uma dificuldade que enfrenta quem quer que assuma um desses compromissos é precisamente o “tempo ordinário” e a sua monotonia. O cinzento do dia-a-dia parece cortar toda a alegria da novidade. Por isso as diversas sociedades sempre valorizaram as festas que funcionam como novos inícios de carreira. Não basta: as festas acabam por se repetir periodicamente e perdem a graça da novidade.
É preciso ter a arte de viver cada dia com a frescura do primeiro. Tentar fazer coisas diferentes cada dia, ou em cada celebração, é ilusório e por vezes caricato. Terrível é, por outro lado, cair na lucidez desencantada do Eclesiastes: Nada de novo debaixo do sol… tudo é ilusão e correr atrás do vento. Para fugir ao cansaço da repetição, cada um tem que renovar-se interiormente. E a melhor ajuda consiste em acolher Aquele que é a própria novidade e faz novas todas as coisas : o Espírito Santo.

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